
O inverno chegou...

Não que ler?
Então ouça a narração:
A campainha tocou.
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Pela terceira vez tocou.
Sara abriu a porta e Sophia a abraçou.
- Me perdoe Sara, assim que soube vim para te ver.
- Meus pêsames Sara – disse Kyam.
- Oi Sara – disse Laurinha abanando a mão.
- Oi minha florzinha.
- Sophia foi tudo muito rápido.... Por que você não nos ligou?
- Tudo bem, fiquem tranquilos.... Não se preocupem com isso. Eu ainda estou tentando entender. Na verdade, está difícil aceitar. Entrem.
Sara foi até a cozinha do apartamento, pegou a bandeja de madeira pintada por sua mãe e colocou sobre ela, algumas xícaras e a garrafa de café sem açúcar.
Sophia e Kyam aguardavam na sala mergulhados num silêncio cruel, observando as fotos na parede, eram vários retratos de Sara com a sua mãe... Em parques, igreja, mercado, praia... Sophia se pegou desejando chorar e ainda buscando palavras.
- Sara eu respeito se você não quiser falar, mas se quiser.... Estamos aqui para ouvi-la. – Disse Sophia.
Sara suspirou:
- Sophia, talvez se eu chorasse já diria muita coisa. Mas faltam lágrimas. Eu ainda sinto que ela vai chegar, trazendo sua sacola de feira... O que fazer quando o coração não entende?
- Sara, no começo é difícil. Quando perdi minha irmã....
- Sara, mas o que foi que aconteceu? Alguns nos ligaram perguntando se sabíamos de algo, se a sua mãe já estava doente.... Não sabíamos, nem ao menos, do velório. – Falou Kyam.
- Me desculpem.... Eu não consegui acreditar no que estava acontecendo, era como se estivesse tentando evitar. Eu levei minha mãe para o médico, semana passada, ela estava sentindo fortes dores abdominais e alguns enjôos. Mas ela estava bem alguns dias antes e eu honestamente achei que era apenas um mal-estar e que passaria o quanto antes. Mas.... Após alguns exames os médicos a diagnosticaram com um câncer muito severo. Eu preferi orar. Achei que se eu contasse aos outros isso seria um sinal de pouca fé. Apenas orava. E vi minha mãe sumindo aos poucos. Cada vez menos lúcida. Já tinha quatro dias que estávamos no hospital e eu estava muito cansada.... Foi quando decidi vir para casa... então me ligaram.
- Meu Deus Sara...
- Liguei para minha tia Dulce e pedi que arrumasse tudo e avisasse quem pudesse, eu me tranquei no quarto.... Já não tinha forças. Não vi mais nada. Acabei de chegar do enterro e sinceramente fico feliz por vocês não a terem visto. Guardem a boa lembrança.... Dela cantando e sempre animada. É o que eu quero guardar para mim.
Uma lágrima solitária deslizou sobre a face de Sara. E ela estava com o olhar mais longe. Ainda lembrando dos dias de primavera... Da sua mãe regando as rosas.
- Sara... Sara... Kyam!
Kyam segurou Sara pelos braços e Sophia tentava acordá-la.
Laurinha rapidamente se escondeu atrás da cortina da sala com o coração batendo forte, ouvindo o desespero, o som do medo compassado pelo relógio...
O inverno chegou.